A mesa 3 da FlinkSampa, com o tema “Olhar Africano”, aconteceu hoje, 19, às 10h, com a participação dos escritores Vera Duarte, João Melo e António Quino.
O bate-papo foi conduzido por Tom Farias, partindo da premiação da escritora moçambicana Paulina Chiziane pelo Prêmio Camões.
“A Paulina é a primeira mulher africana negra a receber o prêmio Camões. E muito importante para essa imensa comunidade dos países de língua portuguesa, é uma imensa alegria ver uma irmã receber esse prêmio”, disse a escritora de Cabo Verde, Vera Duarte. “Neste momento em que estamos tão empenhadas em dar voz e vez à fala das mulheres, a escrita das mulheres, é maravilhoso ver uma colega nossa ser objeto desse prêmio.”
António Quino, escritor angolano, apontou que a literatura africana – e de forma geral – sempre foi muito masculina. “É um prêmio às mulheres africanas fundamentalmente pelo empenho, a luta, não só no campo da própria sociedade, mas no campo literário, porque a literatura africana de forma muito especifica esteve muito marcada por homens.”
Vera ainda afirma que só depois de muita luta e resistência que as mulheres conquistaram esses espaços. “Tivemos a necessidade de enfrentar diversas resistências para poder enfim começar a escrever o nosso nome com visibilidade no edifício literário caboverdiano. Estamos a resgatar as mulheres do memoricídio que sobre muito tempo sobre elas pairou.”
Dificuldades estruturais
Outro ponto de destaque foi a reflexão feita pelo escritor João Melo sobre as dificuldades que os autores africanos, sobretudo os de língua portuguesa, enfrentam. “A pobreza de nossas sociedades é grande, o nível de educação e de instrução, e portanto o gosto pelo livro, é baixo também. São problemas que nós africanos temos que resolver antes de começar a aspirar ser conhecido no exterior”, disse. “Nós, autores africanos que escrevemos numa língua periférica que é o português, também não somos conhecidos pelos demais autores africanos. Há pouca ou quase nenhuma circulação de escritores entre as várias áfricas.”
António comparou a situação dos autores a de moradores de uma ilha. “Parece que estamos rodeados de um oceano imenso que não nos deixa comunicar com o resto de África, porque os outros países de África também não nos conhecem e nós também não os conhecemos.”
Os escritores também destacaram a importância das editoras e da imprensa em se interessar pela produção africana antes que ela seja premiada ou divulgada por veículos europeus e norte-americanos. “Os autores africanos precisam ser validados em Paris, em Londres, Nova York para interessarem a grandes editoras e mídia brasileira”, disse João Melo. “As grandes editoras, a grande imprensa, não sabem nada e não se interessam em saber sobre a produção literária africana. Isso começou a mudar nos últimos anos, internacionalmente começa a ter uma maior divulgação, um maior espaço para as produções africanas.”